segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Você sabia que o fotógrafo que tirou esta foto se matou ?

Eu estou depressivo(…) sem telefone(…) dinheiro para o aluguel(…) dinheiro para o sustento de criança(…) dinheiro para dívidas(…) dinheiro!(…) Eu estou sendo perseguido pela viva memória de matanças, cadáveres, cólera e dor(…) pela criança faminta ou ferida(…) pelos homens loucos com o dedo no gatilho, muitas vezes policial, assassinos(…)
Trecho da carta de suicídio de Kevin Carter
Este trecho é de uma carta de suicídio do fotógrafo sul-africano Kevin Carter(1960-1994) ganhador do premio Pulitzer em 1994. Ele fotografou uma criança faminta, sem forças, rastejando para um campo de alimentação, há um quilômetro dali. Ao lado um urubu observa e espera a morte da criança para poder devorá-la, como se já soubesse apriori e esperasse a morte chegar. Carter observou durante vinte minutos, achando que o urubu fosse embora, como não foi, espantou-o e saiu rapidamente dali. Nesta atitude está todo o peso de seu sofrimento e suicídio. Ele se culpou por não tê-la salvo e refletiu sobre si mesmo naquela cena: “um homem ajustando suas lentes para tirar o melhor enquadramento de sofrimento dela, talvez também seja um predador, outro urubu na cena”.
Por que Carter não a salvou? O que ele pensava? Qual era sua preocupação? Com um pouco de reflexão podemos entender por que razão ele não a salvou. Todos nós, filhos da modernidade, somos espectadores de uma experiência empobrecedora que melhor se conceitua como guerra, fome, miséria, repressão e barbárie. No mundo moderno o mal se tornou comum, é parte da cena cotidiana. O mal se banalizou. Tornamo-nos insensíveis a desgraça alheia. Carter, como fotógrafo, acostumou-se a captar o cinéreo, o claustro e o frívolo em suas fotografias. Acostumou-se a experimentar o mal. Mas pagou um preço alto pela banalização do mal. Quando refletiu sobre a cena, sentiu náusea, culpa, remorso. Suicidou-se. Foi o preço que ele pagou por sua falta de piedade. Digo piedade, pois é por meio desse conceito que podemos entender Carter.
Michel de Souza Aires

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